domingo, 5 de junho de 2011

Sobral Pinto

Nesta semana, li no jornal uma entrevista com um dos jornalistas chineses, correspondentes no Brasil à epoca do golpe de 64, que tiveram sua residência arrombada pelos militares golpistas, todo seu dinheiro roubado, foram presos, barbaramente torturados (qual tortura não é bárbara?) e condenados a 10 anos de prisão. Tendo cumprido aproximadamente  um ano de prisão, receberam a visita de um senhor de 75 anos, que tomara conhecimento da situação deles havia pouco tempo. As visitas do tal senhor repetiram-se duas vezes por semana, trazendo-lhes conforto fraterno, até quando este velho advogado conseguiu a libertação de todo o grupo. A maioria deles já faleceu. Este sobrevivente vive na China e carrega até hoje as marcas físicas da tortura de que foi vítima. Surpreendentemente, afirma que a maior sequela é a de nunca ter recebido um pedido formal de desculpas do governo brasileiro nem ter recebido de volta o dinheiro que lhe foi roubado. Ele entende que esta não é a nossa conduta, pois somos um povo digno, cordial e respeitoso.
Como brasileiro, envergonho-me por tais fatos e anseio pelo dia em que os militares de hoje, que nada tiveram com tantos episódios deploráveis, saibam reconhecer e desculpar-se pelos erros do passado. E, ainda como brasileiro, orgulho-me ser compatriota deste ilustre advogado. (Acrescentado em 13 de setembro de 2014)

Heráclito Fontoura Sobral Pinto, nascido em Barbacena, Minas Gerais, em 5 de novembro de 1893 e falecido no Rio de Janeiro em 30 de novembro de 1991, aos 98 anos, foi um jurista brasileiro, defensor dos direitos humanos, especialmente durante a ditadura do Estado Novo e a ditadura militar instaurada em 1964.

Embora tenha iniciado sua carreira como advogado na área de Direito Privado, acabou por se notabilizar como brilhante criminalista defensor de perseguidos políticos. E, apesar de católico fervoroso que ia à missa todas as manhãs, aceitou defender o comunista Luís Carlos Prestes que fora preso após o levante comunista de 1935. No caso do alemão Harry Berger, que também fora preso e severamente torturado após o mesmo levante, Sobral Pinto exigiu ao governo a aplicação do artigo 14 da Lei de Proteção aos Animais ao prisioneiro, fato bastante inusitado.

A História:

Em 13/Dez/68, quando o arbítrio tomou corpo no AI-5, às 19:30h, o ilustre advogado estava de pijamas e chinelo no quarto de hotel em Goiânia, onde iria mais tarde ser paraninfo de uma formatura. Um major arrombou a porta acompanhado de seis homens armados e em fila.

_ Eu trago ordem do presidente Costa e Silva para o senhor me acompanhar.

Sobral pinto permaneceu sentado.

_ Meu amigo, o marechal Costa e Silva pode dar ordens ao senhor. Ele é marechal, o senhor major. Mas eu sou paisano, sou civil. O presidente da República não manda no cidadão. Se esta é a ordem, então o senhor pode se retirar porque eu não vou.

_ O senhor está preso! _ gritou o major.

_ Preso coisa nenhuma!

A uma ordem do major, os homens que o acompanhavam atiraram-se sobre o velho sentado, agarrando-o e arrastando até o elevador, pelo saguão do hotel até ser jogado no banco traseiro de uma viatura.

Ao comandar aquele seqüestro, o major aprendeu que a bravura cívica pode ter 75 anos, pesar 67 quilos e andar de pijama e de chinelo.

Ao chegar ao quartel, o coronel comandante perguntou:

_ O senhor é patriota?
_ O senhor engula o que está dizendo! Eu sou patriota, o senhor não. O senhor vive à custa do Estado, eu não. _ respondeu o Dr. Sobral.
_ Retirem esse homem e ponham na prisão.

Assim aconteceu com um dos maiores juristas brasileiros, que lutou contra duas ditaduras, sempre defendendo os valores democráticos e os direitos humanos.

14 anos antes deste episódio, após garantir juridicamente a posse do presidente Juscelino, pois os militares já ali queriam dar um golpe e não deixá-lo assumir, o Dr. Sobral Pinto recusou o cargo de ministro do STF, para que não pairasse dúvidas sobre a brilhante defesa que fez da posse do presidente: em hipótese alguma ela foi movida por interesses pessoais.

Bibliografia:

VENTURA, Zuenir. 1968: O ano que não terminou. São Paulo: Planeta, 2008.

WILLIAM, Wagner. O Soldado Absoluto - Uma Biografia Do Marechal Henrique Lott. São Paulo: Record, 2005.

Wikipedia - Heráclito Fountoura Sobral Pinto
Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Her%C3%A1clito_Fontoura_Sobral_Pinto
Visitado em: 07 de junho de 2008

Nenhum comentário:

Postar um comentário